quinta-feira, 5 de junho de 2014

João Ubaldo Ribeiro: nas páginas e no palco

Em 1999, ainda no primeiro semestre do curso de Letras da Universidade Estadual de Feira de Santana, li pela primeira vez “Sargento Getúlio” de João de Ubaldo Ribeiro. Fui indiscutivelmente conquistado pela força de sua narrativa e também pela identificação com aquele universo sergipano, principalmente linguístico, que eu acabara de deixar para viver nas terras baianas. Logo depois fiz um artigo para conclusão de alguma disciplina.
Hoje, 15 anos depois, assisti à peça “Sargento Getúlio” encenada pelo ator baiano Carlos Betão, com adaptação e direção de Gil Vicente Tavares, filho do poeta Ildásio Tavares.
No auditório do Memorial Chesf lotadíssimo, com o apoio sempre fundamental do SESC Ler Paulo Afonso, o público de estudantes, professores e demais espectadores da cidade de Paulo Afonso pode conferir um espetáculo teatral de altíssima qualidade visual, sonora e textual.
A mesma sensação de alegria estética que senti quando li as páginas do livro que contavam a história de um sargento sergipano que vive sua odisseia existencial pelas veredas do sertão nordestino foi renovada vendo o monólogo no palco. Merece grande destaque o desempenho do ator Carlos Betão que personifica vozes de outros personagens de forma magistral, pois sem sair de cena para trocar figurinos, apenas com os recursos vocais e gestuais, ele recria diálogos entre os personagens da narrativa. Momentos líricos são estabelecidos no tecido da peça pelos aboios que atravessam o palco e o coração da plateia e ecoam no próprio texto ubaldiano que muitas vezes se aproxima da poesia popular de matriz nordestina. Mesmo diante das situações mais dramáticas vividas na peça, o riso também ganha seu espaço e envolve o público em vários momentos de alternância entre as reflexões sobre o destino trágico do homem e sua mais cômica e banal possibilidade de rir da sua própria condição miserável diante da tragédia que é viver.  
A peça não substitui a leitura do livro. Isso é claro. Mas o livro também não substitui a beleza da realização cênica da história imaginada pelo engenhoso João Ubaldo Ribeiro, autor de tantos outros livros tão importantes para nossa literatura. Ler e ver a linguagem de João Ubaldo Ribeiro são duas aprendizagens estéticas e várias lições de profundo humanismo.

Cleberton Santos

Paulo Afonso, 05 de junho de 2014.